
15 jun Cosmos para Curiosos #6: planetas podem se formar fora de um sistema estelar?
A ideia de planetas que vagam sozinhos pelo cosmos, sem a companhia de uma estrela, parece saída de um conto de ficção científica. No entanto, a ciência moderna não apenas considera a existência desses corpos celestes como possível, como também começa a encontrá-los em números surpreendentes.
Esses mundos solitários são conhecidos como planetas errantes ou planetas órfãos e representam uma nova fronteira na astrofísica. Durante séculos, a humanidade especulou sobre a existência de outros mundos além do Sistema Solar.
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Foi apenas em 1992 que os primeiros exoplanetas foram confirmados: dois pequenos planetas orbitando um pulsar, um tipo de estrela de nêutrons. Três anos depois, em 1995, Michel Mayor e Didier Queloz anunciaram a descoberta de 51 Pegasi b, o primeiro exoplaneta em órbita de uma estrela da sequência principal.
Representação artística de um exoplaneta em um sistema estelar distante. (Fonte: NRAO/AUI/NSF; S. Dagnello)
A partir dessas descobertas pioneiras, uma revolução começou. Hoje, mais de 5 mil exoplanetas já foram confirmados, muitos dos quais possuem características surpreendentes. No entanto, a maioria está em sistemas planetários parecidos com o nosso, orbitando uma estrela hospedeira. Isso levanta a questão: seria possível a formação de planetas em ambientes totalmente isolados, sem estrelas por perto?
Nos últimos anos, diversas observações apontaram para a existência de planetas flutuando livremente no espaço interestelar. Um dos métodos mais eficazes para detectá-los é o da microlente gravitacional: quando um objeto massivo (como um planeta) passa na frente de uma estrela distante, ele pode amplificar temporariamente sua luz. Esse efeito, previsto por Einstein, permite inferir a presença de objetos invisíveis e solitários.
Em 2021, um estudo com dados do telescópio Subaru e de outros instrumentos revelou evidências de dezenas de planetas errantes na região da Associação de Escorpião-Centauro, uma região rica em estrelas jovens. Estimativas sugerem que possa haver bilhões de planetas errantes apenas na Via Láctea, possivelmente em número maior do que estrelas.
Observação em infravermelho da formação de um disco protoplanetário. (Fonte: NASA)
Qual é a origem dos Planetas Errantes no Universo
A origem dos planetas errantes pode ocorrer de duas maneiras principais, saiba quais são elas abaixo.
Ejeção dinâmica
Um planeta se forma normalmente ao redor de uma estrela, mas interações gravitacionais com outros corpos (como gigantes gasosos ou estrelas companheiras) podem lançá-lo para fora do sistema estelar. Essa é uma explicação comum para planetas errantes detectados em regiões com muitos sistemas binários ou triplos.
Formação direta
Alguns planetas errantes podem se formar da mesma forma que estrelas, a partir do colapso gravitacional de nuvens de gás e poeira. Quando o colapso não é suficiente para iniciar a fusão nuclear, o objeto se torna uma anã marrom ou, se for ainda menor, um planeta. Nesses casos, o planeta nunca teve uma estrela para orbitar.
Detectar planetas errantes é extremamente difícil, pois eles não refletem a luz de uma estrela próxima. No entanto, se forem jovens, ainda podem emitir calor remanescente da formação, detectável no infravermelho.
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Além disso, microlentes gravitacionais e observações futuras com telescópios como o Nancy Grace Roman Space Telescope devem melhorar nossa capacidade de encontrá-los.
Representação artística de um planeta errante, fora de órbita de uma estrela hospedeira. (Fonte: NASA)
Os planetas errantes podem ter massas variáveis, desde algumas vezes a massa de Marte até várias vezes a massa de Júpiter. Alguns podem ter luas, atmosferas ou mesmo oceanos subterrâneos, se houver fontes internas de calor.
Embora pareça improvável, alguns cientistas especulam que certos planetas errantes poderiam manter condições favoráveis à vida, especialmente se tiverem uma atmosfera espessa ou fontes de calor geotérmico. Em teoria, um oceano subterrâneo, protegido por uma crosta de gelo, poderia existir em um planeta errante, de forma semelhante ao que ocorre em luas como Europa e Encélado.
Esses ambientes estariam protegidos da radiação interestelar e poderiam abrigar vida microbiana. Embora a ideia ainda seja especulativa, ela mostra como a busca por vida no universo está se expandindo para muito além dos “planetas habitáveis” tradicionais.
Planetas errantes podem conter oceanos líquidos embaixo da superfície. (Fonte: NASA)
Missões como o JWST (James Webb Space Telescope) e o futuro Roman Telescope abrirão novas janelas de observação. Além disso, experimentos de microlente continuarão a revelar novos candidatos a planetas errantes. Simulações computacionais também estão sendo usadas para entender quantos desses planetas existem e como se distribuem na galáxia.
Os planetas errantes representam uma das descobertas mais intrigantes da astrofísica moderna. Sejam eles exilados de sistemas estelares ou não, esses mundos solitários desafiam nossas ideias sobre formação planetária, habitabilidade e a própria definição do que é um planeta.
A cada novo avanço tecnológico, aumentamos nossa capacidade de detectar e estudar esses objetos misteriosos. No nosso Universo vasto e repleto de espetáculos ocultos, os planetas órfãos nos lembram de que ainda há muito a explorar, inclusive em lugares onde antes achávamos que nada poderia existir.