O browser da OpenAI e o fim da Internet como a conhecemos [Coluna]

TL;DR: O novo browser da OpenAI não é só uma inovação técnica. É um ataque frontal ao modelo de troca de valor da internet. Vai além do zero clique e torna paywall irrelevante, negociações inócuas e “pay per crawl” obsoleto. Quando a IA é o destino final, não há tráfego a distribuir. Nem valor a retornar.

A Batalha disfarçada de conveniência

Nas próximas semanas a OpenAI deve lançar seu browser nativo com IA. A promessa, uma experiência fluida sem sair da interface conversacional. A realidade, captura definitiva do tráfego.

O que parece um avanço na usabilidade é, na verdade, uma mudança de poder. Dados do Press Gazette mostram que buscas com zero clique no Google saltaram de 56% (maio/24) para 69% (maio/25). A OpenAI não quer apenas participar desse jogo, quer reescrever as regras. E, ao optar por um browser próprio, em vez de depender de terceiros, sinaliza sua intenção de controlar todo o ciclo, da consulta ao dado.

A nova desintermediação

Com 500 milhões de usuários semanais, o ChatGPT está prestes a se tornar a homepage do mundo. Ironicamente, o browser da OpenAI será construído sobre o Chromium, usando a base open-source do Google para desafiar o próprio Chrome.

Enquanto isso, soluções como o “pay per crawl” do Cloudflare tentam reequilibrar a balança, permitindo que publishers cobrem pelo acesso de bots. A lógica econômica se inverte. Se o valor antes fluía para quem publicava, agora é retido por quem interpreta.

Estamos testemunhando um movimento simultaneamente brilhante e assustador. Brilhante porque redefine a experiência de navegação de uma forma que nenhuma empresa conseguiu desde a navegação por browsers. Assustador porque representa o controle definitivo sobre o meio de troca de informações. E quem controla o meio, define o jogo. É a materialização de um novo ciclo de Kondratiev, onde a tecnologia da IA não apenas substitui infraestruturas anteriores, mas captura inteiramente o valor gerado por elas.

Não é disputa por tráfego. É redefinição de realidade

Consultas sobre notícias no ChatGPT cresceram 212% desde janeiro de 2024. No Google, caíram 5%. A OpenAI integrou seu agente web Operator diretamente na navegação, permitindo que o browser atue em nome do usuário, preencha formulários, reserve jantares e compre passagens; sem sair da interface.

Conteúdos premium se tornam apenas combustível para sistemas que entregam respostas, mas não tráfego. Valor sem visita.

O novo pacto Faustiano da informação

Quanto melhor o conteúdo, maior sua utilidade para treinar a IA e menor a necessidade de visitar a fonte original. Publishers como Reuters e WSJ aparecem com frequência nas respostas do ChatGPT, mas esse tráfego indireto é ínfimo frente ao que se perde.

A OpenAI está construindo um novo oligopólio, em que a informação não é buscada. É mediada, sintetizada e entregue por agentes conversacionais.

Guerra por talentos ou pelo controle da infraestrutura?

A OpenAI contratou dois ex-VPs do Google Chrome e já sinalizou interesse em adquirir o próprio navegador se a Alphabet for obrigada a vendê-lo. A Meta responde contratando o brasileiro Mat Velloso, ex-DeepMind, para liderar sua aposta em superinteligência. Os salários ultrapassam US$ 100 milhões. A disputa não é por tecnologia. É por quem define os meios de troca da nova era.

E os publishers?

O modelo da Cloudflare ainda presume um mundo de bots e visitas. O browser da OpenAI opera em um mundo onde essas categorias deixam de existir.

Para os publishers da América Latina, o risco é maior. Sem presença institucional forte nem acesso a negociações bilaterais com big techs, a desintermediação será silenciosa e total.

The 42* question

Se a próxima disrupção no meio de troca já começou, por que ainda estamos tentando resolver a anterior?

*”42 é a resposta. Mas, creio que o problema, para ser bem honesto, é que você nunca soube qual era a pergunta”, Brian Adams.